Wednesday, April 23, 2014

Consigo me dar bem com isso

          A aceitação foi uma das melhores escolhas que tomei em minha vida. Como se de repente uma enorme tempestade acabasse. Não que o tempo ruim às vezes não volte; temporais chegam e quase assolam minhas estruturas. Quase. Apenas aceito os temporais e não tento mudar os céus por isso: é um fato. Não permaneço embaixo daquela gelada água gritando, praguejando pela minha sorte, com raiva de Deus. Procuro um abrigo. Corro para onde der, um lugar para me proteger, mesmo que seja um pouco. Aprendi fazer muito do pouco, render uma porção de migalhas.
          Protegido, observo. Observando, aceito. É assim meu modo de agir. Antes de tudo, não brigo com os fatos: eles são o que são e sua natureza é definida por algo maior do que nosso orgulho ou teimosia. São constituídos de uma matéria tão rígida e estável, que podemos passar a vida inteira batendo os punhos contra eles e nada se alterar. Então, por que ferir corpo e alma desse modo? Lutando contra algo mais forte do que nós? Acredito do mesmo modo que estão ali com um propósito, por mais turvo que nos pareça. Do que sabemos desta vida?
          No curto espaço de tempo que já vivi, pude observar bem as pessoas ao meu redor. As que conhecia - ou assim julguei - e as que passavam por mim, alheias à minha atenção. E de uma maneira homogênea, com poucas e quase imperceptíveis variações, nenhuma aceitava a vida como ela é. As mesmas reclamações, as mesmas posturas, quase o mesmo olhar sobre o andar da carruagem, quase sempre o mesmo perfil. Pareciam formigas andando de um lado para outro (mas as formigas de verdade possuem um caminho traçado!), carregando um peso, querendo transferi-lo a todo custo, desejando que chegue logo o inverno sem precisar trabalhar na primavera. Na época em que cheguei a essa conclusão, havia comprado uma blusa com a seguinte frase: "todos querem mudar o mundo, mas ninguém quer mudar a si mesmo". Parece clichê, mas foi assim. Fato.
          Ainda reclamo muito sobre uma infinidade de besteiras. Faz parte da minha natureza, e aceito isso. Sei que nem tudo dará certo, que a analogia da montanha-russa se aplica muito à vida. Altos e baixos, curvas e retas, felicidades e tristezas, esse tipo de coisa. Nunca acreditei plenamente naquilo das pessoas 100% felizes. Não que acredito em uma vida triste e sem graça (a vida pode ser triste e sem graça ali, e muito bem, obrigado, aqui), mas sempre duvidei dos comerciais, revistas e livros de quem sempre está sorrindo. E confirmei isso depois que descobri minha própria felicidade, quando percebi que ela pode ser doce e salgada, como um quitute de padaria.
           É importante dizer que mesmo esta aceitação não é algo passivo, apenas fechar os olhos e deixar se dominar. Faz parte de mais um esforço necessário para ir em frente na caminhada. Se você fechar os olhos e esperar algo acontecer, será dominado por medo, tristeza, solidão. Você pode aceitar isso também, a escolha é unicamente sua. Aceitar as coisas como são não é simples; requer passar por cima de seu orgulho, daquilo que acredita ser verdade, de sua vontade, de você mesmo, aceitar o que os outros vão - e acredite, eles irão! - falar sobre você e seus modos.
          Aceitei muitas coisas depois disso, e minha balança espiritual foi atingindo um certo equilíbrio. Ainda não cheguei à totalidade. Aceito as provas pelas quais terei ainda que passar, e espero ser muitas, pois quanto mais tive que trabalhar para mudar meus antigos conceitos, mais balanceado fiquei. Não me neguei mais nada, não me fiz grandes censuras, permiti ser. Tudo isso foi muito positivo: chorei quando queria chorar, deixei que a raiva se manifestasse, já andei gargalhando pela rua, sem vergonha alguma, falei o que estava preso em minha garganta, abracei quando não era para abraçar, recusei beijos de quem nunca gostei. Nunca me senti tão leve e tão vivo. Vivo!
          Percebi que as pessoas vivem seguindo um código de ética meio furado. Possuem uma doutrina moral que não sabem mesmo de onde vem. Querem que vivamos de uma maneira que estão completamente distantes, se incomodam com defeitos alheios que possuem em exagero, se irritam pelo modo como as pessoas são. Tudo isso se resume em medo de ser e aceitar sou própria natureza. Quando me falam "pare de rir assim! É estúpido!", apenas escuto "Eu não tenho coragem de fazer isso também, então não me deixe constrangido comigo mesmo". Não descarto a possibilidade de minha risada ser estúpida. O fato é: aceito. E tenho estado feliz assim.
          Poucas vezes senti necessidade de mudar algo quando esse conselho veio de uma terceira pessoa. Não por orgulho ou vaidade; não encontrei uma verdadeira necessidade, nem um real propósito que não fosse o orgulho e vaidade de quem o dava. Aceitei meu próprio orgulho e vaidade e passei a tomar conta dos dois. Agora sei quando eles agem, quando dão as caras e tentam roubar a cena, e assim posso os controlar. Aceitei meus defeitos, minhas risadas estúpidas, as manhãs de péssimo humor, não saber contar piadas, ser um galanteador de terceira, um bom amigo, bom coração, sonhador. Quando me abri aos meus sentimentos e crenças, me aceitei e me conheci.
          Não preciso temer nada. Sei quando é necessário fazer mudanças, e sei quando estou fazendo a coisa certa. Ativamente vou contra-balanceando os pesos em minha vida. Consciente. Muitos me questionam sobre minhas condutas, meu modo de pensar e ver o mundo. Poucos percebem que não forço essa minha visão à ninguém, que dou minha opinião quando pedem, que explico quando estão interessados em saber e não em julgar. Ou tentar me mudar. Sou assim, nem 8 ou 80, mas tudo que existe entre. Consigo me dar bem com isso. E você?

Gabriel Costa
23/04/2014
          
          
          

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