Thursday, July 31, 2014

Aqui e lá outra vez

          Sou péssimo para finais. Sempre tive a intuição que nada acaba verdadeiramente; tudo se transforma, já dizem há séculos. Chego lá e simplesmente não consigo colocar um ponto, uma muralha, fechar as portas impedindo que a história continue. Sempre me fica uma expectativa, uma reviravolta, como se tudo voltasse ao ponto inicial, e de uma maneira diferente, tudo acontecesse novamente. Seria como reviver sempre os mesmos fatos, através de outras perspectivas. Sou bom em colocar vírgulas, apenas uma interrupção naquilo que se viveu até ali, para que em breve os personagens continuem suas linhas. Sou um escritor que começou um livro e não quer acabá-lo nunca.
          Apego-me fácil ao afeto e ternura que existe no romance de viver. Em como a vida tem seu perfume sedutor e seu toque sútil, que nos faz amá-la mesmo em meio suas adversidades. Talvez seja eu um aventureiro que esteja amando a selvageria de existir. Amo os momentos, as estórias, os fatos, como tudo pulsa em seu próprio ritmo, mas ainda, de uma maneira divina, faz parte do mesmo coro. Como se entrelaçam tantas coisas que parecem fora do eixo, como respostas surgem no meio do caos, como a certeza de algo maior se faz presente nos menores gestos.
          Sou melhor nos meios, e vou tropeçando pelos começos; alguns são melhores que outros, depende de minha disposição, da cor de meus sapatos, o quanto dormi. Posso criar inúmeros capítulos prolongando a metade; criei uma habilidade de afastar-me do fim. Porém, o fim a mim chega - a todos nós. Sem muita dificuldade vou desembolando um novelo de situações, e assim crio um novo retalho de vida, mais um trecho de história, para a colcha que nunca quero terminar. A verdade é essa: nunca quero terminar.
          Estou preso há coisas que já ninguém mais lembra. Sou um saudosista. Os pedaços que me constituem nunca deixarão de ser eu. Cada centímetro do que sou está fundado em experiências. Nunca deixo nada para trás. Nunca termino. Prolongo os aprendizados e vou os remodelando diante das necessidades. Sou um mosaico de passado, presente e partes que o futuro irá preencher. Tenho espaços em branco e capítulos epopeicos. Sei que sou hoje uma continuação do que fui ontem, e bem antes disso, e continuarei para sempre sendo algo, servindo a um propósito sem fim. Quero que seja assim; arrepia-me a ideia de que todos os meus esforços simplesmente acabem com o fechar dos olhos.
          Fecho ciclos, atravesso portas. Vou de um quarto para outro, de cidade em cidade, de corpo em corpo, de abraços a abraços. Mas não paro. Como se meu coração pulsasse em tudo, minhas vontades dessem energia ao que me cerca, meu ser espalhasse vitalidade ao universo. Sinto-me como parte essencial de muito; sinto-me realmente como um todo. Ainda sim, possuo minha individualidade, com a qual posso contribuir da maneira que me foi designado e permitido. Vou descobrindo como enganar o "acabar", e crio continuações. 
          Sou péssimo para finais, que acabo repetindo os começos. Entretanto, sei que é necessário fazer uma conclusão de tempos em tempos das nossas experiências, convívios, conhecimento. Prefiro encarar com uma pequena pausa para uma novo e brilhante começo. Gosto de começos, e ainda mais dos meios. Para mim é assim: sem fim. Escrevo longas frases, parágrafos extensos, uma leitura difícil e cansativa, para que somente aqueles que tiverem amor à vida possam ler: requer atenção, calma, reflexão e ação. Quero participar de muito. Quero ver até onde posso dar mais vida à vida e assim vou continuando,

Gabriel Costa
31/07/2014

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